Justiça condena quatro PMs da Bahia por estupro coletivo e extorsão após década de luta
Depois de dez longos anos de espera, a Justiça Militar da Bahia finalmente condenou quatro policiais militares por crimes hediondos cometidos contra uma mulher e seu companheiro em Salvador. As penas variam entre 7 e 33 anos de prisão, mas a luta por justiça ainda não acabou.
Os condenados são Sergio Luiz Batista Sant'anna, Valter dos Santos Filho, Josival Ribeiro Ferreira e Pablo Vinicius Santos de Cerqueira, todos da 49ª Companhia Independente da Polícia Militar de São Cristóvão.
Um crime que choca pela brutalidade
Na madrugada de 30 de novembro de 2015, no bairro de Mussurunga II, esses agentes do Estado, que deveriam proteger a população, invadiram a casa de um casal sem mandado judicial. O que aconteceu depois revela a face mais sombria do aparelho repressor.
A mulher foi violentada sexualmente por três dos policiais em uma casa vizinha em construção, enquanto seu companheiro era torturado e extorquido. Os criminosos chegaram a gravar o estupro e depois apagaram os arquivos, numa tentativa covarde de esconder suas atrocidades.
"Um dos policiais encontrou um cabo de vassoura no local e ameaçou introduzir o objeto nela", relatou a vítima em seu depoimento.
Extorsão e chantagem
Além do estupro coletivo, os PMs extorquiram R$ 5 mil do casal, ameaçando plantar drogas em sua casa. O companheiro da vítima foi mantido em cativeiro por mais de cinco horas, sendo torturado no posto da própria 49ª CIPM.
A família das vítimas sofreu ameaças durante todo o processo e precisou se mudar por segurança. Uma realidade cruel que mostra como o sistema muitas vezes revitimiza quem já sofreu.
As penas: justiça tardia mas necessária
Valter dos Santos Filho, apontado como líder da ação criminosa, recebeu a maior pena: 33 anos e 4 meses de prisão. Josival Ribeiro Ferreira foi condenado a 32 anos, 3 meses e 16 dias. Sergio Luiz Batista Sant'anna pegou 18 anos, 11 meses e 16 dias, e Pablo Vinicius Santos de Cerqueira, 7 anos, 9 meses e 16 dias.
Todos perderam seus cargos e graduações militares, mas até quinta-feira (4) ainda não estavam presos, apesar da decisão determinar que não poderiam recorrer em liberdade.
Provas irrefutáveis da barbárie
A investigação encontrou vestígios de sêmen na parede do quarto onde aconteceu o crime, além de seis fotos da mulher nua e um vídeo do estupro nos celulares dos criminosos. Os arquivos deletados foram recuperados pela perícia, mostrando que foram criados exatamente no horário do crime.
A vítima também passou por exame de corpo de delito, que comprovou as agressões físicas sofridas.
Um padrão de violência
O caso revela que não foi um crime isolado. Moradores relataram que cerca de dois meses antes, os mesmos policiais já haviam ameaçado o casal, e a mulher foi tocada nos seios e nádegas. A segunda abordagem teria sido uma represália pelo fato de terem registrado o caso na delegacia.
A resposta institucional
A Polícia Militar se limitou a dizer que "desvios individuais não refletem o trabalho da corporação". Uma resposta protocolar que não enfrenta a realidade da violência policial sistemática que assola principalmente as periferias e comunidades pobres.
A defesa de Valter dos Santos Filho alega que ele sofre de esquizofrenia paranoide e questiona a validade da perícia psiquiátrica. Mas independente das manobras jurídicas, os fatos são claros e as provas, irrefutáveis.
Justiça que tarda, mas não falha
Este caso expõe a face mais brutal da violência policial no Brasil. Enquanto a população clama por segurança, parte dos agentes que deveriam protegê-la comete crimes hediondos. A condenação, após dez anos, é um alívio, mas também um lembrete de como nossa justiça é lenta para os crimes cometidos por agentes do Estado.
A luta das vítimas por justiça deve servir de exemplo e esperança para tantas outras que sofrem caladas a violência do aparelho repressor. Só com transparência, punição exemplar e reformas estruturais poderemos construir uma segurança pública que sirva ao povo, não contra ele.