Roubo na Biblioteca Mário de Andrade expõe descaso com patrimônio cultural público
Valor do seguro das obras de Matisse e Portinari é mantido em sigilo enquanto criminosos seguem foragidos
Mais um ataque ao patrimônio cultural brasileiro. No domingo (7), dois homens armados invadiram a Biblioteca Mário de Andrade, no Centro de São Paulo, e roubaram 13 obras de arte de valor inestimável: oito gravuras de Henri Matisse e cinco de Candido Portinari da série "Menino de Engenho".
O episódio revela a vulnerabilidade de nossos espaços culturais públicos e levanta questões sobre a proteção adequada do patrimônio que pertence ao povo brasileiro.
Sigilo protege quem?
Cauê Alves, curador-chefe do Museu de Arte Moderna de São Paulo (MAM), revelou que os valores do seguro são sigilosos por contrato. "Os valores de seguro são sigilosos por contrato. A gente não pode revelar", declarou.
Mas para quem serve esse sigilo? O curador foi claro ao explicar que "o seguro é um paliativo" e que "a seguradora reembolsa, no máximo, o valor segurado, mas a recuperação das obras é o mais importante".
A realidade é ainda mais dura: "O seguro é muito mais como prêmio de consolação. Não se pode recuperar um patrimônio desse. Não está disponível no mercado para comprar", afirmou Alves.
Como aconteceu o crime
Os criminosos agiram com frieza. Renderam uma vigilante e um casal de idosos visitantes, seguiram até a cúpula de vidro, colocaram as obras em uma sacola de lona e fugiram pela saída principal.
Vigilantes correram atrás de policiais militares que patrulhavam a região, mas os suspeitos já haviam desaparecido. As câmeras do Smart Sampa conseguiram registrar os ladrões caminhando pela Rua João Adolfo, no Centro Histórico, carregando algumas obras.
Patrimônio do povo brasileiro
As obras roubadas representam parte da nossa identidade cultural. Candido Portinari, considerado um dos maiores pintores brasileiros, teve suas ilustrações levadas junto com gravuras do francês Henri Matisse, um dos nomes mais importantes da arte moderna mundial.
Entre as obras de Matisse estão "O palhaço", "O circo", "Senhor leal" e "O pesadelo do elefante branco". Já as cinco ilustrações de Portinari fazem parte da obra "Menino de Engenho".
Histórico de descaso
Esta não é a primeira vez que a Biblioteca Mário de Andrade, a segunda maior do país, sofre com a criminalidade. Em 2006, doze gravuras raras do século 19 foram furtadas do local. As peças só foram recuperadas pela Polícia Federal em 2024, 18 anos depois.
A Biblioteca, que completou 100 anos em fevereiro e recebeu mais de 207 mil pessoas no ano passado, merece proteção à altura de sua importância cultural e social.
Onde estão as políticas de proteção?
A Secretaria de Cultura e Economia Criativa informou que as obras tinham seguro vigente e que o local conta com vigilância e câmeras de segurança. Mas claramente não foi suficiente.
O prefeito Ricardo Nunes disse que as câmeras identificaram os ladrões, que estão sendo procurados. Até a última atualização, os criminosos permaneciam foragidos e as obras não foram encontradas.
Este episódio expõe a necessidade urgente de políticas públicas mais robustas para proteger nosso patrimônio cultural. Não podemos aceitar que tesouros da humanidade fiquem vulneráveis por falta de investimento adequado em segurança.
A cultura é um direito do povo e um dever do Estado. É hora de agir com a seriedade que o patrimônio brasileiro merece.